"O Pintinho e o Poço"


Dentro dum caixote, um pintinho com a cor de pinta
passa quase todo o tempo preso, piando, só:
- "Pio, pio, pio, pio, pio..." - um piar que pinta
de amor o vento lento, acarinha as plantas e só
some quando Poesia, que dorme numa pena,
desperta. Deus, depois de ouvir de Poesia o canto,
faz o coração do dono do bicho sentir pena:

A mão que tinha fechado... abre o caixote; e do canto
que não dá saudade, o pintinho sai cheio de graça:
Cambaio, já corre para o poço, que todo mundo
sente medo de se aproximar. - "Como é uma graça
estar aqui!" - declara-se o pinto, sentindo o mundo
girar à sua volta. E na borda do poço, pia
olhando pra baixo: - "Pio, pio, pio..." - "Ele chama
alguém? Doidinho é?" - bichos perguntam-se. - "Aqui é a pia
onde lavo minha alma" - grita. O poço sente chama,
não mais se sente um monstro... (Canta alegre ali, pois acha
que tem outro pinto lá embaixo e que está sendo ouvido
e correspondido, ao ouvir o próprio eco; assim, ele acha
a companhia que lança esperança em seu ouvido.)


Ruilendis