Atrás da Vida

Atrás da Vida

 

 

Dentro de uma catedral, Miaumiau, um gato idoso, perguntou para Nhiunhiu, um rato jovem e órfão: – Por que você não sai daí desta toca?

- Eu estou com medo da morte – respondeu o rato, sem ao menos colocar a cabeça para fora.

- Eta! Tão novo e já tem medo da morte - disse, muito abismado.

- Pois é! O que eu posso fazer?

- Bem... para você não ter medo da morte, tem que ir atrás da vida.

- Atrás da vida? Como assim? Não estou entendendo.

- Vá atrás da vida, siga-a, mas não corra; a vida está andando; não ande mais rápido do que ela. Psit! como você se chama?

- Nhiunhiu e você?

- Meu nome é Miaumiau. Nhiunhiu, vá logo atrás da vida; você está atrasado.

- Cadê a vida?

- Ela está andando, está lá na frente.

- Então para não se ter medo da morte é preciso ir atrás da vida! Eu vou atrás dela.

Bem alegre e confiante, Nhiunhiu deixou a toca; e sem levar nada, foi atrás da vida.

- Tchau! – despediu-se o rato.

- Tchau! Nhiunhiu. Mas depois, volte e me conte tudo, viu?

- Viu! Tchau!

No momento em que saiu da toca, ficou encantado com a imensa catedral; ficava olhando para todos os lados; e depois de andar um pouco, ouviu a voz de uma rata que estava em cima dum piano cinza: - Para onde você vai?

- Eu vou atrás da vida.

- Atrás da vida? Cuidado! Lá na frente está sendo celebrada uma missa; tem muita gente por lá.

- Missa? Gente? - pensava ele, que nunca tinha ouvido essas palavras.

- Se você passar por lá, homens vão lhe trazer a morte.

- Ah! é isso. Não tenho tanto medo da morte. Eu estou atrás da vida - falou, muito confiante.

- Você deve ser louco. Meus pêsames!

Mesmo vendo um monte de pessoas, Nhiunhiu andava pelo meio delas e as observava sem entender o porquê de estarem de olhos fechados. Ninguém o viu passar, pois estavam rezando.

Ele andava sempre em frente, e quando não dava mais para ir em frente, geralmente, virava à direita.

Ao sair da catedral, logo encontrou um animal, um cachorro deitado em frente a ela.

- Olá! Meu nome é Nhiunhiu. Qual seu nome? - perguntou baixo.

- Olá! Eu me chamo Auau. O que você quer?

- Quero saber se você viu a vida passar por aqui?

- A vida? Por quê?

- É que eu estou atrás dela. Ouvi dizer que quando se vai atrás da vida, não se teme a morte.

- É mesmo? É mesmo? Eu não sabia. Você me deixa ir atrás dela com você - falou com grande entusiasmo.

- Por que você quer ir comigo?

- Porque estou com medo da morte. Olha... raramente, eu saio daqui, pois tenho medo dela. Todos os dias, rezo para a morte não me pegar. Vivo assim desde pequeno. Sobrevivo com comidas que pessoas jogam para mim.

- Sei como você se sente. Auau, você pode vir comigo atrás da vida.

- Que alegria! Muito obrigado por me deixa ir com você.

O rato subiu em cima do cão. E os dois se tornaram amigos inseparáveis. Auau se tornou o primeiro amigo de Nhiunhiu. Viviam como andarilhos e andavam sempre unidos atrás da vida.

Enfim, o rato perguntando para muitos se viram a vida, fez centenas de amigos que, muitos também, foram atrás dela. Alguns foram com ele sendo amigos fiéis; já outros iam sozinhos. Passou a vida toda atrás da vida e encontrou uma rata, tendo muitos filhos com a mesma.

Já bastante velho e cansado, vivendo nas ruas com a própria família, decidiu voltar à catedral para reencontrar o gato Miaumiau. Com a ajuda de um dos seus amigos, um gavião que o carregava, chegou lá.

- Miaumiau! cadê você - gritava o rato andado à procura do gato.

- E aí, Nhiunhiu! Como vai você? Como foi andar atrás da vida? Me conte tudo.

- Eu estou bem. Aliás, mais ou menos. Ir atrás da vida foi a melhor coisa que aconteceu; fiz centenas de amigos, tenho filhos e uma esposa. Acabei andando, brincando e trabalhando demais! Estou tão cansado! Estou velho! e cansado de ir atrás da vida. Ah! quero descansar; quero dormir; quero encarar a morte: é o que mais desejo neste momento... Miaumiau... alguns amigos meus correram atrás dela e se deram mal em alguns momentos, por que se deram mal?

- Veja... quando a gente vai atrás da vida, ela lhe protege. A vida está na sua frente para proteger. Ela abre passagem para você passar, guia o nosso caminho, tira obstáculos e mostra buracos para que a gente desvie deles. Quando a gente está atrás da vida, ao a gente correr, pode-se passá-la ficando na frente dela, portanto o risco da queda e de se machucar é maior do que no momento em que se está atrás.

- Agora, entendo tudo! Miaumiau, por que você não me comeu da primeira vez que você me viu em sua frente, já que faz parte da cadeia alimentar o gato comer o rato?

- Eu não o comi antes porque gosto de rato maduro. Como você está maduro agora, farei com você o que fiz com seus pais...

O gato comeu o rato, que desejava tanto a morte naquele instante.

 

 

Ruilendis